sábado, 30 de julho de 2011

Modificações de superfícies ósseas, fracturação com bigorna: I. Elementos de Bos taurus em estado fresco (continuação)

Enquadramento e Metodologia

Este post é o prosseguimento do anterior, desta vez apresentando os resultados concernentes a outros dois elementos de Bos taurus, nomeadamente uma tíbia e um rádio. Uma vez mais, os elementos encontravam-se em estado fresco, com tecidos moles nas áreas junto das articulações e tecidos remanescentes nas diáfises. A fracturação foi realizada com o mesmo chopper sem remoção prévia do periosteum. Os contactos ocorreram sobretudo nas diáfises (tíbia, rádio), mas também perto da metáfise distal (rádio). No que respeita à metodologia analítica seguiram-se as opções previamente delineadas e explanadas.

Resultados: fracturação e estigmas de percussão

Identificaram-se vários indicadores tafonómicos de fracturação antrópica, salientando-se as perfurações e golpes, assim como os contragolpes e abrasões (Gráfico 1).

Gráfico 1: Principais dados tafonómicos registados.

Tíbia (Figuras 1 e 2): identificaram-se 6 fragmentos de dimensões >5cm e 12 esquírolas de dimensões <5cm, das quais 5 eram cones de percussão (E2, E3, E6, E8, E10). Os impactos de percussão comparecem isolados (E5, E6, E17) e unicamente nas faces craniais dos elementos; os contragolpes e abrasões comparecem unicamente nas faces caudais (E15, E16, E17 e porção proximal) e devem-se ao uso de bigorna. Foram registadas duas lascas parasitas e algumas extracções medulares/corticais. As perfurações e golpes evidenciam-se quase unicamente isoladas (n=5) (Gráfico 2).

Figura 1: Resultado da experimentação (tíbia – Bos taurus).
Figura 2: Selecção de alguns dos indicadores tafonómicos evidenciados.

Rádio (Figura 3 e 4): identificou-se somente um fragmento de dimensão >5cm que corresponde grosso modo à diafise do elemento; 14 esquírolas apresentavam dimensões <5cm. Registaram-se cones de percussão (E1, E3, E12), impactos de percussão isolados (E3, E13, E16), uma abrasão isolada (E16), lascas parasitas (E15, porção proximal e distal) e várias extracções corticais e medulares. As perfurações e golpes encontram-se em vários fragmentos (E13, E14, E15), geralmente concentradas (E15), sendo que várias delas são imensuráveis (E14, E15) porquanto se encontram sobrepostas (Gráfico 2).
Figura 3: Resultado da experimentação (rádio – Bos taurus).
Figura 4: Selecção de alguns dos indicadores tafonómicos evidenciados.

Gráfico 2: Dimensões das perfurações e golpes.

Resultados: planos de fractura

No total os elementos analisados apresentam 34 planos de fractura analisáveis, 26 na tíbia e 8 no rádio. É clara a relação entre as delineações curvas (únicas identificadas), os ângulos oblíquos e as superfícies suaves. Contudo, é de salientar o grande número de ângulos mistos identificado na tíbia, assim como as superfícies irregulares (Gráfico 3). O rádio apresentava poucos planos de fractura comparativamente com a tíbia, como consequência as medições dificilmente são comparáveis. No rádio denotou-se uma predominância de ângulos entre os 70º e os 95º, não se tendo registado qualquer ângulo inferior a 45º ou superior a 145º. Para a tíbia, é clara a predominância de ângulos entre os 70º-95º e 95º-120º, tendo-se registado planos com <45º e um com >145º.


Gráfico 3: Análise dos planos de fractura segundo a delineação, ângulo e superfície.

Perspectivas futuras: esta experiência é um primeiro passo para a elaboração de um protocolo experimental que visa a obtenção de dados actualistas acerca das modificações realizadas por fracturação antrópica. Com base nos dados já apresentados encontramo-nos em condições de realizar uma primeira versão de uma ficha relacionada com este tipo de fracturação, a qual será divulgada nos próximos dias.

Agradecimentos: uma vez mais agradecemos ao Fumeiro da Beira (Mação) por carinhosamente nos darem os ossos de Bos taurus para a experimentação.

Nelson Almeida